A crise econômica que se estabeleceu no país e atingiu diretamente o setor sucroalcooleiro, principalmente as usinas produtoras de açúcar e etanol, levou grande parte das empresas à insolvência e obrigou a Justiça a intervir com medidas de recuperação judicial e decretação de falências. Entretanto, o longo tempo para as decisões causam o sucateamento das instalações e inviabilizam a retomada das atividades, o que faz aumentar a desesperança dos trabalhadores que enfrentam a crise social causada pelo desemprego e o não recebimento de direitos trabalhistas.
Estudos de entidades do setor mostram que, até o ano passado, mais de 50 usinas estavam fechadas no Brasil, 30 delas apenas no Estado de São Paulo. As que ainda operam, enfrentam dívidas e a instabilidade do mercado, o que impede o fortalecimento do setor, que é considerado estratégico. Grande parte das usinas de açúcar e etanol está quebrada, a maioria em recuperação judicial e muitas já falidas.
Os processos judiciais lentos e as administrações das massas falidas a cargo de advogados e contadores nomeados pelo Judiciário, transformam o patrimônio, que poderia ser reutilizado para atividade produtiva, em moeda de troca para custeio da manutenção e pagamento de dívidas, incluindo a remuneração dos próprios administradores. Sem possibilidade de recuperação, os parques das indústrias são vendidos a sucateiros para custear a manutenção, a segurança e o próprio processo de falência.
No município de Palmital, já são três empresas nesta situação, também em processo de deterioração, além de outra fechada há mais de uma década. Das cinco usinas do município, apenas uma está em operação. Ibirarema perdeu suas duas usinas: a Pau D’Alho, fechada desde 2012, e agora falida, além da Santa Hermínia, antiga Oncinha, cujas instalações estão simplesmente desaparecendo. A vizinha Cambará, no Paraná, perdeu a usina Casquel, fechada há vários anos e com suas instalações industriais em liquidação.
Perda de patrimônios
Marcos Fava Neves, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP de Ribeirão Preto, analisou a situação para uma reportagem do programa ‘Globo Rural’, no ano passado. Ele lembrou o incentivo ao investimentos, há cerca de oito anos, e a crise que praticamente engoliu o setor. “Esse período de crise representou para os empresários a perda de patrimônio das famílias. Acreditaram muito no que estava sendo falado, correram investir, e isso gerou um problema porque nós colhemos muita ineficiência devido ao excesso de investimentos em curto espaço de tempo”, exemplificou.
E a crise não tem fim. Há quem diga que o ano de 2016 poderia ter sido de retomada, mas o abandono das usinas é o retrato de que o desafio tem proporções gigantescas. “O endividamento do setor supera, no mínimo, 1,2 vezes o seu faturamento. O setor fatura R$ 90 bilhões e deve R$ 130 bilhões. Existe a culpa da falta de política pública, existe a culpa dos empresários que não tiveram uma boa gestão e a crise afetou toda a cadeia: o fornecedor, as usinas, os trabalhadores, a indústria de bens de capital e todos os municípios que são dependentes da cana-de-açúcar”, diz Antônio de Pádua Rodrigues, diretor técnico da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Única), entidade que agrega as usinas do centro-sul do Brasil.
Para cada usina fechada, estima-se que, pelo menos, 500 famílias sejam atingidas diretamente. Essa relação pode ser ainda maior, se considerada a cadeia como um todo. Junto com as usinas, os fornecedores e as empresas prestadoras de serviço também sofrem as consequências, criando o chamado efeito cascata na economia ligada à agroindústria.
Desaparecendo
Uma das usinas mais antigas da região, a Casquel, de Cambará (PR), teve sua falência decretada em fevereiro do ano passado, com passivo estimado em R$ 60 milhões. A indústria, que já chegou a empregar mais de 600 trabalhadores na agricultura e a processar cerca de 21 milhões de litros de álcool e 4,5 toneladas de açúcar, agora está em processo de liquidação.
As áreas agrícolas foram arrendadas para cobrir custos do processo de falência e manutenção do parque industrial, que agora também está sendo vendido, fazendo a usina simplesmente desaparecer. O administrador judicial da massa falida é o contador Sérgio Henrique Miranda de Souza, de Londrina.
Pau D’Alho
Um dos símbolos do desenvolvimento da região do Médio Vale Paranapanema, a Usina Pau D’alho, de Ibirarema, fechou as portas no final de 2012, não chegou a entrar em recuperação judicial e teve sua falência decretada em fevereiro do ano passado, quando a dívida já passava de R$ 600 milhões. Nos últimos cinco anos, as instalações permanecem em processo de sucateamento e muitos equipamentos foram vendidos para quitar dívidas, garantir a segurança, a manutenção do parque industrial e a remuneração do administrador judicial, o mesmo da Casquel, assim como do corpo jurídico nomeado pela Justiça.
Mesmo com o interesse de fornecedores e empresários da região em retomar as atividades, falta celeridade da Justiça em analisar as propostas e, assim, viabilizar o funcionamento da indústria, cuja iniciativa deve minimizar os efeitos da crise, recuperar milhares de empregos para a região e gerar impostos para as cidades.
Enquanto se aguardam os prazos, os equipamentos estão se deteriorando, os custos de manutenção crescem e a possibilidade de retorno da produção fica cada vez mais distante. O parque industrial antes pujante, que chegou a moer 2 milhões de toneladas de cana a cada ano, está se transformando em cemitério de máquinas e equipamentos de difícil recuperação.
Segundo Alexandre Andrade, presidente da Federação dos Plantadores de Cana do Brasil, com sede em Brasília, é preciso agilidade no processo de recuperação das usinas para que a atividade seja viabilizada.
Presidente da Feplana fala de experiência positiva de Pernambuco
O agricultor e empresário Alexandre Andrade de Lima, presidente da Feplana – Federação dos Plantadores de Cana do Brasil, com sede em Brasília, falou a O Diário do Vale sobre a experiência positiva do acordo para recuperação de usina no Estado de Pernambuco. Segundo Alexandre, um acordo entre Ministério Público, Judiciário, Justiça do Trabalho e Sindicato dos trabalhadores, possibilitou a recuperação e o arrendamento da Usina Cruangi, que estava em recuperação judicial na cidade de Timbaúba.
“Graças à rapidez do processo, houve tempo para recuperar o parque industrial, recontratar cerca de 1,5 mil funcionários e retomar as atividades que garantem o desenvolvimento da região”, salientou. Alexandre considera que o principal objetivo não é receber débitos da massa falida, mas sim viabilizar a retomada do funcionamento das usinas para melhorar a economia das cidades e gerar empregos em tempos de crise. “Sem voltar a funcionar, ninguém recebe seus créditos, sejam fornecedores ou trabalhadores”, concluiu.