Por Sabrina Lorenzi, da Agência Nossa | 02/06/2019
O Brasil tem pouco a comemorar nesta semana do Meio Ambiente. O esvaziamento do ministério que leva seu nome, com fusões e transferências de órgãos especializados para outras pastas, e o descaso com temas relacionados a mudanças climáticas podem colocar o Brasil na mira de fornecedores e compradores dos nossos produtos no exterior. Pior que a ameaça comercial, está em jogo o abastecimento de água, sobretudo no Sudeste.
As ações do governo Bolsonaro nos cinco primeiros meses de mandato preocupam quem se importa com o tema. Foi extinta a Secretaria de Mudanças Climáticas. O Serviço Florestal Brasileiro foi para o Ministério da Agricultura. A Agência Nacional de Águas, embora continue firme em medidas que priorizam Meio Ambiente e interesse público, foi transferida para o Ministério do Desenvolvimento Regional. Lembrando que o MMA quase foi extinto no início do governo.
O governo cancelou um encontro regional da ONU sobre mudanças climáticas que aconteceria em Salvador. E não enviou representantes ao Peru para uma conferência sobre gestão florestal e agricultura organizada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). As ações soam como ironia para um governo que colocou militares de volta no poder.
“Foram justamente os militares que perceberam a importância da preservação do Meio Ambiente e criaram este aparato, criaram o Ministério do Meio Ambiente. É um equívoco querer desmontar, ainda mais ele (o presidente Bolsonaro), orgulhoso das realizações dos militares”, afirma o biólogo Rodrigo Medeiros, vice-presidente de parcerias e estratégias da Conservação Internacional.
Recentemente, o governo desautorizou a destruição de equipamentos usados em ações ilegais de desmatamento. A medida era uma maneira de reduzir o desmatamento em locais isolados da floresta, onde há dificuldade de transporte e locomoção.
O desmatamento da Amazônia está ganhando velocidade. O Imazon detectou altos índices de desmatamento na Amazônia Legal de agosto de 2018 a abril de 2019. Foram perdidos 2.169 km²de floresta, número que representa um aumento de 20% da área desmatada em relação ao mesmo período do ano anterior.
A especialista do Greenpeace em Políticas Públicas Mariana Motta relaciona o desmatamento das florestas ao recente episódio de seca extrema que esvaziou os reservatórios de água do Sudeste. A seca levou reservatórios a níveis de volume morto em São Paulo e várias outras cidades. Provocou salinização severa do rio Paraíba do Sul, que abastece a cidade do Rio de Janeiro. Resultou em queimadas e prejuízos ao agronegócio no Centro- Oeste. Secou as lagoas do interior de São Paulo, para citar alguns casos além da agonizante problemática do Nordeste.
“Ao desmatar a Amazônia, interferimos de forma extremamente negativa no ciclo da água. Eventos extremos, como episódios de seca – muito parecidos com a crise enfrentada pelo Sudeste – se tornarão cada vez mais frequentes e mais intensos com as mudanças do clima. Estudos mostram uma tendência geral para as estações chuvosas ficarem mais intensas e, secas, para ficarem mais severas, ou seja, os extremos hidrológicos serão mais frequentes e intensos”.
O superintendente de Planejamento da ANA, Sérgio Ayrimoraes, afirma que o desmatamento e a erosão dos solos podem favorecer a redução na precipitação, a escassez de água e a piora nas condições de qualidade da água. Mas pondera que a compreensão das causas da ocorrência dos baixos índices de precipitação e da dinâmica de sua distribuição ainda é imprecisa devido, principalmente, ao curto período de observação dessas anomalias.
“Os padrões de distribuição das chuvas variam naturalmente. Porém, nos últimos anos têm sido observados eventos extremos, de seu excesso ou escassez, que podem ser indícios de mudanças climáticas e/ou de alterações mais intensas nos padrões da precipitação no Brasil”. Cerca de 19% da floresta amazônica foi destruída nos últimos 40 anos.
A taxa voltou a crescer em 2018 depois de uma redução de 20% no período anterior. Os estados do Pará, Mato Grosso e Amazonas concentraram quase todo o desmatamento. A destruição foi maior em áreas privadas, depois em assentamentos e unidades de conservação.
A Amazônia transpira, diariamente, 20 bilhões de toneladas de vapor de água para a atmosfera – volume superior à vazão do rio Amazonas. Toda essa umidade forma os “rios voadores” que são levados, com o vento, para outras regiões do País, irrigando plantações e enchendo reservatórios de água.
O ex-ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, chamou o ministério do Meio Ambiente de “sucursal da Agricultura” e também alertou para o impacto do desmatamento na oferta de chuvas e abastecimento de água. “Se mexe na Amazônia, mexe nas chuvas”, disse em entrevista à BBC.
Manifesto que reúne dezenas de organizações em favor do meio ambiente afirma que se o desmatamento da Amazônia atingir entre 20% e 25%, a floresta entrará em um “ponto de não retorno”, a partir do qual todo o seu equilíbrio será modificado.
“Retrocessos na agenda ambiental do País podem representar riscos enormes à reputação das empresas e produtores brasileiros, colocando o Brasil na contramão do movimento global de transição para a economia de baixa carbono”.
Pontos positivos
Por outro lado, o governo tem, por meio da ANA, adotado medidas firmes que protegem rios e garantem abastecimento de água para a população. A proibição de outorgas para irrigação em estados como Goiás e Minas Gerais, além da suspensão de processos para novas hidrelétricas no Pantanal, têm contrariado interesses econômicos nessas regiões.
Outro ponto positivo no programa de governo de Bolsonaro para o Meio Ambiente é o fortalecimento de fontes de energia alternativa. A ideia é fazer do Nordeste um pólo produtor de energia solar e eólica, inclusive com produção de equipamentos que também vão estimular emprego e renda na região.
O plano é fazer do Nordeste base de uma nova matriz energética limpa, “expandindo não somente a produção de energia, mas toda a cadeia produtiva a ela relacionada: produção, instalação e manutenção de painéis fotovoltaicos”.